Pregando a eficiência energética e econômica, Edifício Cidade Nova foi a primeira construção a receber o selo verde no Rio
Em vez de uma ilha de calor, tem-se uma ilha “vidrada” na sustentabilidade. Pesquisa permanente em novas tecnologias e aplicação das existentes são as características que levaram o edifício Cidade Nova, empreendimento projetado pela Ruy Rezende Arquitetura, a ser o primeiro a receber o selo verde do conselho norte americano de prédios verdes.
Além de técnicas de construção e sistemas para redução dos custos de manutenção o edifício Cidade Nova, localizado no centro da capital fluminense, também foi construído levando em conta questões sociais e urbanísticas para afetar positivamente a vizinhança.
“O que nós fizemos no Cidade Nova não foram novidades, e sim a aplicação de conceitos já existentes”, disse Rezende. “A grande novidade efetiva de tudo isso está fora do prédio e não dentro, que foi o grande comprometimento social. Nós tratamos todo o empreendimento passando por todas as empresas envolvidas, para certificar que elas estavam comprometidas socialmente com tudo ao redor do empreendimento”.
O trabalho começa com os funcionários, que devem ser registrados e legalizados, seguindo todos os preceitos de segurança e boas condições de trabalho. Já os fornecedores de todo o material básico devem garantir que a origem do material não ultrapasse a distância de 800 quilômetros da obra.
“Este conjunto de conceitos é que faz todo o diferencial, tornando o empreendimento não apenas sustentável, mas também sendo uma questão de tratamento humano”, explicou o arquiteto.
Todos estes itens são necessários para o edfício obter a certificação Leadership in Energy and Environmental Design (LEED).
O trabalho da RRA, como é conhecido o escritório de arquitetura, vem desde 1999 quando o principal sócio da empresa resolveu melhorar a qualidade de vida dos trabalhadores e reduzir o impacto ambiental dos projetos que desenvolvia, após identificar que haveria uma necessidade futura do mercado de alinhar-se à Agenda 21. O começo foi difícil e uma escola que ensinou o arquiteto a usar argumentos que vão além do custo da obra, uma das principais barreiras para investimentos no setor.
Segundo Rezende, apostar em práticas transparentes e construções que reduzem os impactos no meio ambiente é um bom negócio, pois fará bem não só a si mesmo como também para seus funcionários, clientes e ao meio ambiente.
Eficiência energética e econômica
“A gente tenta mostrar que por conta das técnicas implantadas e das economias obtidas permanentemente, existe um balanço social da empresa no qual vale a pena investir”, disse.
Além disso, o arquiteto explicou que o resultado se traduz em economia na manutenção do edifício uma vez ocupado.
“Quando a gente fala de uma arquitetura sustentável, a gente fala, de troca de energia, intenção de diminuir a carga térmica e assim aumentar o conforto humano e diminuir o uso do ar condicionado” disse Rezende. “Isso tudo é um conceito”.
No edifício Cidade Nova, como em outras edificações planejadas para obter a certificação LEED, o investimento é mais alto que os investimentos em projetos convencionais. Rezende calcula que os projetos com menor impactos ambientalis podem custar de 7% a 10% a mais, porém com um retorno dentro do prazo de 18 a 24 meses, principalmente pela economia nas contas.
No projeto Cidade Nova o controle de insolação do edifício foi feito com a aplicação de dupla pele de vidro na estrutura do edifício para evitar a entrada do calor. Isto reduz o uso de ar condicionado no empreendimento e uma economia de 60% no consumo de energia.
Além disto, o ar condicionado que for usado sairá do piso, atingindo a uma altura máxima de dois metros do solo, considerada zona de conforto térmico para o ser humano. O projeto foi baseado em estudos que mostraram que os dutos de ar condicionado instalados em tetos e paredes são menos eficientes.
Maior grau de eficiência energética será o resultado do projeto arquitetônico propriamente dito. A iluminação de 90% do prédio será feita por meio de uma clarabóia de 900 m², explicou Rezende.
Para reduzir a conta de água, além de baixar a demanda por água potável do sistema de distribuição de água urbano, a água de chuva e de condensação do sistema de ar condicionado será coletada e destinada para limpeza, irrigação dos jardins e para os vasos sanitários. Segundo cálculo feito pela RRA, o resultado será uma diminuição de 40% do consumo diário previsto.
Olhando além das questões econômicas na manutenção, o projeto priorizou o uso de materiais reciclados e recicláveis, e produtos de revestimento e adesivos com baixa emissão de compostos orgânicos voláteis (COV) ou alinhados com créditos de carbono.
Toda esta tecnologia é resultado de um aprendizado de quase uma década, segundo o arquiteto.
“Hoje se mostra bem mais fácil, porque tudo que está ai no mercado, as técnicas que a cada dia se mostram mais e mais”, concluiu Rezende. “Um exemplo é a venda do crédito de carbono”.
Rezende não acredita que o custo alto seja mais um empecilho aos clientes. Mas a RRA continua investindo em pesquisa de novos materiais e inovações na área.
Atualmente um consultor de elétrica está estudando o uso de lâmpadas eficientes, mais caras, porém, mais econômicas.
“O tempo de vida da lâmpada que está sendo estudada é de cinco a seis anos”, afirmou. “Será um investimento pago rapidamente e que trará uma economia a longo prazo”, disse Rezende.
O edfício Cidade Nova é mais um na linha da RRA, que já implanta estes conceitos em todos os seus projetos.
“O termo que a professora Roberta Kronka, da faculdade de arquitetura e urbanismo da universidade de São Paulo (FAU-USP), usa é o nosso lema para a sustentabilidade: ‘É uma forma de promover a busca pela igualdade social, valorização dos aspectos culturais, maior eficiência econômica e menor impacto ambiental nas soluções adotadas nas fases de projeto, construção, utilização, reutilização e reciclagem da edificação, visando a distribuição eqüitativa da matéria-prima e garantindo a competitividade do homem e das cidades’”, finalizou Rezende.
Efeito Chaminé
Manter a transparência e barrar o calor envolveu estudos das equipes de arquitetura, de projetos complementares – ar-condicionado, esquadrias, estruturas metálicas – e da construtora. Em conjunto, os profissionais decidiram executar uma segunda pele de vidro, sem perfis de alumínio na posição vertical, apenas com juntas secas entre os painéis.
Com o afastamento de 60 centímetros entre os dois componentes da dupla pele, obtém-se o efeito chaminé: o calor que atravessa a primeira fachada sobe e se dissipa na atmosfera, antes de passar para o interior do edifício. Alvim garante que esse sistema reduz em quase 50% os gastos com ar-condicionado, economia que em quatro anos pagará o investimento com a fachada dupla. Também há ganhos em isolamento acústico, devido à barreira extra de vidro. A face externa tem laminados de dez milímetros e a interna, de oito milímetros. Os painéis de grandes dimensões chegam a ter 2,5 x 3,20 metros.
Sistema de Vagonamento
Na concepção das fachadas, o arquiteto Ruy Rezende propunha uma marcação horizontal, com as linhas verticais extremamente delgadas. Em reunião de equipe, a engenheira Heloísa Maringoni sugeriu o sistema de vagonamento (tipo de protensão) ancorado em mãos francesas, que serviriam, simultaneamente, de espaçadores da fachada e de apoios para a passarela de limpeza externa dos caixilhos.
Uma das preocupações, segundo Heloísa, foi o controle de deformação diferencial entre as linhas com apoio fixo e as com apoio nos vagonamentos, assim como o desenvolvimento de detalhes que permitissem ajustes precisos. Outro ponto foi a definição da seqüência de montagem, para manter os alinhamentos. “O conceito não é novo, pois uma rede entre dois coqueiros usa o mesmo sistema, só que na horizontal”, compara a engenheira. Mas adotá-lo em grande escala, com um material que oferecia limites para deformações, era novidade.
“As análises estruturais se basearam em estudos de estática aplicada e não em programas sofisticados de cálculo. Esta foi a grande novidade: a utilização de conceitos básicos com materiais de alta tecnologia”, diz Heloísa, diretora da Cia. de Projetos, que fez os projetos de estruturas metálicas dos caixilhos, clarabóia e escada helicoidal. As fachadas do prédio e do átrio totalizaram 86 toneladas de perfis.
Sistemas de fachadas
Para a execução das fachadas foi necessário compatibilizar os diversos sistemas especificados, num plano uniforme e horizontal, no lado externo, e mantendo as diferenças no interno, explica o engenheiro Arimatéia Nonatto, gerente de Engenharia & Produtos da Belmetal. Outro desafio apresentado pelo Cidade Nova foi a tecnologia aplicada à construção da fachada dupla, pois a face voltada para o exterior é afastada da edificação, sem montantes, sendo sustentada por tirantes de aço fixados na estrutura. Estes estão posicionados a cada 2,50 metros, contraventados por cabos de aço entrecruzados. Uma pele de vidro do sistema Grid Skyline volta-se para a cidade, enquanto a face voltada para o interior do edifício adota o sistema entre vãos Offset 8.0.
O sistema Grid Skyline, na pele externa, é composto de colunas e travessas que têm a mesma geometria interna, formando uma grelha. A geometria externa configura outra grelha com as tampas externas. É um sistema montado com tampas, contratampas e colunas, que aprisionam os vidros através de gaxetas externas, contra as internas. Na segunda pele, os caixilhos entre vãos são engastados em inserts, na parte superior e num trilho inferior. O módulo é içado por fora, encaixado e, depois, repousa no trilho, sendo instalado paralelamente, até fechar o vão, como se fossem células macho/fêmea. No processo, entram em ação as gaxetas verticais, que pressionam as células em seus montantes. Esse sistema permite o uso de janelas maxim-ar.
No fechamento da fachada do térreo foi empregado o conceito stick (fachada Atlanta), no qual o perfil do módulo forma um colar, dando a volta na coluna e na travessa. As colunas de 180 x 97 milímetros vencem vãos de mais de seis metros. A montagem segue a seqüência de ancoragens, colunas e travessas e, depois, os módulos com os vidros, em sistema de fixação frontal através de presilhas. No stick, a montagem ocorre pelo lado externo, num balancim, de cima para baixo.
As outras fachadas, incluindo o fechamento do átrio, foram executadas com módulos unitizados do sistema Offset Wall. Estes têm altura igual à do pé-direito do pavimento e, pelo lado interno, foram içados por gruas e engastados em inserts fixados à estrutura. É um sistema de montagem rápida, mas os módulos não podem ser desmontados, já que são coligados por uma barra de transição. Na verificação estrutural, portanto, é considerado o modelo de viga contínua, e o carregamento é limitado ao intervalo entre as barras. No caso de troca dos vidros, a operação é feita pelo lado externo, com o auxílio de um balancim e seguindo um conjunto de procedimentos de segurança, explica Nonatto.
Clarabóia Central
Alinhados no mesmo eixo, dois blocos do edifício Cidade Nova estão interligados por um átrio com pé-direito até o topo da construção e protegido por clarabóia de 900 metros quadrados, com vidros laminados de dez milímetros. As áreas de circulação dos pavimentos voltam-se para esse espaço, onde também está localizada uma escada helicoidal de acesso ao primeiro andar. Para a execução da cobertura envidraçada foi feita uma maquete em escala, pois os arquitetos queriam que a clarabóia desse um toque especial ao edifício. A solução permitiu fazer a análise dos perfis, definir onde seriam instalados os sprinklers, como a clarabóia seria iluminada e de que maneira se retiraria o ar quente e insuflaria o ar frio.
A clarabóia funciona como uma imensa bolha de ar quente, forçando o ar frio a descer e refrescar o ambiente. Segundo Alvim, chegou-se a pensar em vidros duplos, mas “a própria natureza resolveu o problema, pois não existe melhor isolamento térmico do que o ar”. Durante a noite, quando o ar-condicionado é desligado, o ar frio que vem de fora também ajuda a reduzir a temperatura interna. Durante o dia, a clarabóia permite a visão do céu e a entrada da luz natural em todo o átrio. Quando há necessidade de sombreamento, uma persiana é acionada por sistema automatizado. A clarabóia tem 28 metros de vão livre, 31 metros de comprimento e três metros de flecha de arco. Está apoiada em estrutura metálica com segmento de arco circular, biapoiado e atirantado. No arco, foi empregado perfil triangular de 250 x 200 milímetros; nas terças, perfil retangular de 100 x 80 milímetros; e nos tirantes, tubo circular de 50 milímetros de diâmetro. O maior problema na instalação da estrutura foi o lançamento dos dois primeiros arcos e sua estabilização, explica o engenheiro Wilson Ramos, da Construmet, que executou as estruturas da clarabóia, da escada helicoidal e de sustentação da pele de vidro do edifício. “Nós o resolvemos com a pré-montagem dos dois arcos e a respectiva solidarização em um espaço disponível na laje de cobertura, de onde se fez o içamento e o transporte horizontal para o local definitivo, através de uma guia”, afirmou Ramos.
Fonte: revista sustentabilidade / FINESTRA